Arles, 16 de outubro de 1995
Xabier, refeito, retorna ao hotel com a urgência de falar com alguém; decide ligar para seu amigo de faculdade, Andoni Knörr, que prontamente o atende e, como se soubesse do ocorrido, indaga, num francês impecável: mon ami, o que lhe aflige?
Vivendo um misto de emoções, brevemente relata a infinidade de fatos ocorridos em tão poucos dias, no país vizinho. Andoni, a cada novidade, soltava gritinhos de êxtase, culminando com um gemido ao ouvir o nome “Juliette".
- Acho que estou completamente apaixonado, e não sei o que fazer com isso.
- Amigo, você está na Provença, realizando seus sonhos e ainda por cima, amando. Quer situação melhor? Apenas desfrute o momento, e me convide para o casamento, por gentileza! E assim desligaram, não sem antes soltarem boas risadas.
Ato contínuo, o interfone chama, com a recepcionista informando que Juliette iria falar: “vamos conhecer o local onde era a Casa Amarela? Já que você frequentou outras residências de Van Gogh, não custa nada conhecer mais uma...”, soltou, com uma ironia típica das mulheres. Xabier, por um breve instante, perguntou a si mesmo se falou mais o que devia para ela, mas tinha certeza de que não o fizera; atribuiu o comentário à velha e boa intuição feminina. Refeito, contra-atacou: “que tal se você subisse ao meu quarto, ao invés disso?”, sem acreditar na coragem recém-adquirida.
Poucos segundos após, seus lábios se reencontram ardentemente, seus corpos, como um só, entregues à plenitude. No quarto, a rádio suavemente exala amor, com “Ribben in the Sky", sucesso atemporal de Stevie Wonder*, que Xabi ameaça timidamente sussurrar ao seu ouvido:
"Oh, so long for this night I prayed
That a star would guide you my way
To share with me this special day
Where a ribbon's in the sky for our love
If allowed may I touch your hand
And if pleased may I once again
So that you too will understand
There's a ribbon in the sky for our love
Do, do
Do, do, do, do, do
This is not a coincidence
And far more than a lucky chance
But what is that was always meant
Is our ribbon in the sky for our love, love
We can't lose with God on our side
We'll find strength in each tear we cry
From now on it will be you and I
And our ribbon in the sky
Ribbon in the sky
A ribbon in the sky for our love
Do, do
Do, do, do, do, do
There's a ribbon in the sky for our love"
E, mesmo de olhos fechados, ele revê as estrelas cintilantes de outrora, em seu devaneio solitário nas alamedas de Arles, girando em direção ao único destino possível: Juliette.
Pode parecer tolo, mas naquele momento, Xabier Izarrigue sentia-se vingando Vincent Van Gogh na sua derrota para o amor.
*Atalho para a música (humildemente, sugiro a audição durante a leitura do capítulo):